sexta-feira, 28 de agosto de 2015

OS SANTOS

por Anselmo Ramos

Durante uma catequese com adolescentes, um padre (Pe Valdecir) pediu aos jovens que definissem “o santo”. Várias opiniões foram partilhadas, mas uma em particular chamou muito a atenção do padre. Um dos adolescentes respondeu:

“Santo é um cara de cabeça torta, mãos postas e cara de fome”.

Imediatamente acorreram à memória do padre inúmeras imagens conhecidas de santos, e ele pode confirmar que a resposta do jovem fazia sentido, partindo da possibilidade de que os raros contatos daquele rapaz com a figura de um santo foram as visualizações das imagens que os pais ou avós tinham em casa.

Acaso não tem sido essa também a nossa realidade?
O que temos ensinado às novas gerações a respeito dessas figuras extraordinárias que chamamos de “santos”?
Temos passeado pelas vidas deles, seus testemunhos e exemplos, ou os continuamos apresentando como figuras mágicas que protegem isso ou aquilo e cujo respeito se encerra na veneração e cuidado de suas imagens de gesso?

Podemos não perceber, mas até mesmo esse zelo com as imagens acabam passando uma ideia errada do que nós mesmos conhecemos a respeito dos santos. Sim, pois o excesso de cuidado com uma simples imagem, tipo: “cuidado pra não quebrar”, “cuidado pra não arranhar”, etc., transmitem uma ideia de fragilidade a respeito daquele personagem. Há até quem segure uma imagem como se fosse um bebezinho.

Claro que a nossa veneração aos santos passa também pelo cuidado com as imagens que chamamos “sacras”. Mas de nada adianta cobrar o zelo e o cuidado e não apresentar os motivos pelos quais os veneramos, respeitamos e amamos até mesmo em suas representações plásticas.

Quem é o santo, então?

Talvez a resposta que o Pe Valdecir esperava ouvir daqueles adolescentes, seja essa, que eu gostaria de partilhar também com vocês.

Vamos entender os santos em três pontos:

1)    Os santos são antes de qualquer coisa homens e mulheres como você e eu. Seus nascimentos se deram exatamente como os nossos; assim como nós foram amamentados, precisaram aprender a falar e a andar... O Francisco de Assis, o Antonio, a Clara, também sujaram suas fraldas, e não era nada diferente das nossas. Ainda na infância tiveram seus brinquedos, foram educados e escolarizados (cada um de acordo com o contexto em que viveu, e essa ambiência também serviu para moldar suas personalidades, assim como a nós hoje). Viveram o período da adolescência, com as mesmas crises e transformações. E para alguns, a juventude também foi uma época de muitas festas, baladas e“pegação”. Alguns na juventude optaram pela vida monástica ou sacerdotal, outros pelo matrimônio.
           
E foi nessa situação, vivendo a dimensão humana, que eles optaram por um estilo de vida diferente, e aqui entramos no segundo ponto:

2)    Ao abraçar a mensagem cristã e tornar a Palavra de Deus sua regra de vida, esses homens e mulheres se tornaram diferentes, e eram até visto por muitos como indivíduos separados dos costumes da maioria das pessoas à sua volta. (Etimologicamente, a palavra santo quer dizer [também] “separado”(do grego, hagios) Então este jeito novo de viver, embora com características bem próprias a cada um, tinha algo em comum: a imitação de Cristo. Por isso o desapego material (aos bens terrenos e até ao próprio corpo, também matéria); o apego incondicional aos mais desprotegidos e necessitados; o desejo inesgotável de fazer o bem a quem quer que necessitasse; a perfeita sintonia com Deus e sua vontade e o amor pela Igreja. E com uma força e energia que não era sua, alguns foram a lugares onde ninguém se atrevia a ir, sem medo e sem repugnâncias, levar a Palavra de Deus, não só na pregação, mas principalmente na prática do amor.

Tornaria-se por demais alongado este artigo se eu fosse citar exemplos de tudo isso que resumi no segundo ponto. Mas é graças a esta diferença, em virtude do seu testemunho, que esses homens e mulheres, jovens ou idosos, são merecidamente intitulados pela Igreja como “Santos”.

3)    Porque a Igreja não “fabrica” santos; ela assim os declara, após uma criteriosa investigação acerca da vida e testemunho. É o povo de Deus, os membros da Igreja que apresenta a ela os motivos pelos quais este ou aquele merece ser “elevado à honra dos altares”. O testemunho de vida advoga em favor do “candidato”, juntamente com a aclamação popular. O santo não o é porque a Igreja assim o declarou, mas porque buscou isso em vida, gratuita e despretensiosamente, despertando no coração do seu povo a gratidão e o desejo de tê-lo como exemplo. A Igreja, repito, nas fabrica santos, embora seja ela um canal de aproximação ao Evangelho e sua proposta de santidade.

Portanto, por mais que sejamos convidados e autorizados a venerar esses cristãos que nos precederam, inclusive em suas representações artísticas (imagens), não é a isso que deve se resumir a nossa devoção a eles.

Mais do que importante, é necessário lembrar que, antes de tudo isso, eles foram homens e mulheres como nós, com o diferencial: o diferencial da radicalidade na fé e na caridade. E se assim considerarmos, muito mais do que acender velas, levar flores, fazer novena, carregá-los nos andores, precisamos honrar as suas memórias imitando aquele que eles próprios buscaram imitar: Jesus Cristo. E se eles foram capazes, nós também o seremos, se nos deixarmos guiar pelo Espírito Santo e cultivarmos o amor ao próximo e à Igreja, assim como eles, tão dedicadamente o fizeram.

Algumas imagens de santos até podem ter cabeça torta, mãos postas e cara de fome. Mas os santos sempre tiveram o olhar voltado ao irmão, a vida de oração e traziam na sua face o rosto misericordioso de Deus.


Que os santos e santas de Deus intercedam a Deus por nós em nossas fraquezas. 


Clique AQUI e assista o vídeo.

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